A+BA

Passei a última semana em Buenos Aires, e fora os tradicionais passeios, compras, vinhos e parillas, também tentei entender porque a propaganda porteña está bombando, ganhando tudo e assumindo a sua posição de vanguarda na publicidade internacional.

A sensação geral é de que deu um pouco pra entender, só não sei se eu vou conseguir explicar. Talvez dando um panorama geral do comportamento dos nossos hermanos, indo desde moda, consumo e cultura até a propaganda que eu vi na TV, passando pelo já conhecido default dramático porteño (aliás, tudo passa por aqui), talvez o prezado leitor possa tirar suas conclusões.

Política e economia

O nome desse post, A+BA, é o novo lema das ações do governo de Buenos Aires, e significa Actitud Buenos Aires, e aí vc já começa a ver como andam as coisas na capital da Argentina. O país acaba de sair de uma crise econômica braba, e está parecendo o Brasil há dez anos, em plena arrancada do plano Real. Tudo parece em estado de renovação, a cidade, bairros novos sendo construídos, e uma economia nova, efervescente, na mão de novos empreendedores. Ainda não se vêem SUVs blindados pela rua a torto e a direita, mas já se vêem concessionárias BMW, Mercedes, Audi e etcs - sinal de que já estamos a caminho de uma sociedade de consumo mais forte.

Os jornais e a TV mostram muito da vida urbana cotidiana, um ou outro pepino político (essa semana eu vi dois: uma mala preta encontrada no gabinete de uma promotora pública e uma ministra do meio ambiente praticando nepotismo), mas nada que tenha se tornado um escândalo. Violência, zero. Teve só um caso de um garoto que invadiu o escritório da ex-namorada, e manteve meia dúzia de reféns durante horas, no centro da cidade. Mas pra nós brazucas, quase acostumados a coisa bem mais escabrosa, tudo parece muito naïve. (Em tempo: não vi uma vez a cara ou o nome do presidente argentino, ao contrário do nosso grande salvador que aparece no brasa em todas as capas de jornal todos os dias).

Os ídolos argentinos são Carlos Gardel, Diego Maradona, Che Guevara. No BR, Zeca Pagodinho (Zéca-Feira, para os mais chegados) e Ivete Sangalo ("ou seja, cerveja), e aí também está outro sinal. O povo portenho me pareceu, entre outras coisas, menos suscetível ao consumo proposto por propagandas abestalhadas e barulhentas, porque possui raízes mais sólidas, é um povo mais intelectualizado, nacionalista, mais ligado à sua história e sua tradição. Os muros de Buenos Aires, quando pichados (ví poucos), trazem mensagens politizadas, do tipo "independência" e "liberdade". Ou "Boca Campeón", por supuesto.

Moda e consumo

Imagina um cruzamento do estilão smooth-cabelera-latino-fútbol do Zago com o esquema indie da Isca e vc terá não um ET porteño, mas os jovens boludos do bairro-sensação de Buenos Aires, Palermo SoHo. (atenção: não confundir o cruzamento de estilos com o cruzamento da Isca com o Zago - cena chocante). As chicas, por sua vez, muito bonitas, estilosas e enfáticas. As mais discretas (pero muy interessantes) se vestem no mais puro estilo Kika com frio.

(Pra ver mais, tente o City Runway, blog de street style de BA, dica da Oficina de Estilo. Obs: o look Kika com frio não está nesse blog.)


O novo barrio da moda é igual à Vila Madalena no quesito "pequenas lojas de moda e design tocadas por jovens intrépidos e descolados", junto com oficinas mecânicas e bares e restaurantes bacanas. Me lembrou muito a Vila Madalena de dez anos atrás. Quem se lembra do Lanterna? Então, é por aí mesmo. É quando o alternativo, underground, passa a ser reconhecido como bacana, descolado e cool.

A diferença é que as marcas grandes, de rede, estão indo pra lá também. Me chamou muito a atenção para o caso das marcas de sportswear clássicas - Nike, Puma e Adidas. A Nike é o caso mais bacana, porque lá ela se divide em dois tipos de loja (a Adidas também): Tem um tipo de loja, nos shoppings e grandes ruas comerciais, que é igual às lojas que eles abriram no Brasil recentemento, tudo muito clean e padronizado, só com o swoosh na porta e letras fininhas - com um plus: algumas lojas dessa linha mais comercial é exclusivamente feminina - Nike Women. Mas tem também outro tipo de loja, identificada pelo logo um pouco mais antigo (o swoosh com o type Nike junto) escrito em dourado, e essas lojas são muito legais. A de Palermo, chamada Nike SoHo, está instalada em uma casa caindo aos pedaços por fora, e com um interior meticulosamente mal-ajambrado, com o papel de parede "original" da casa, móveis kitsch e tudo mais. O logo vc quase não vê, num banner de pano de 50 cm na lateral. O mix de produtos também é distinto. Resultado? Comprei um tênis.

A loja da Levi's em Palermo Soho nem tem nome nem marca. A loja da Puma no barrio também segue a linha da diferenciação, só um pouco mais enlatada que a Nike. Diesel também tá lá (cheia de brasileiro). Adidas tem uma linha de lojas paralela, Originals, com o logão antigo, e também está em Palermo. E as lojas locais, one-of-a-kind, que são muito legais, muito bem-boladas. No fim, fica uma mistura legal de Vila Madalena, Galeria Ouro Fino e Mercado Mundo Mix. O endereços e sites eu coloco em outro post.

Cultura

Sentei em uma livraria-café-loja de CDs com uma revista e perguntei pro dono da lojinha de CDs o que estava tocando: Maria João, portuguesa, Patricia Barber, francesa, e um cantor de Tango contemporâneo argentino. Comentei que gostei muito dos dois primeiros, "vou levar", e que achei o de tango meio dramático.

"-Dramático, como el Tango.", respondeu, dramaticamente, o orgulhoso (e jovem) dono da lojinha. (Escrevendo agora, me arrependi de não ter comprado o tal CD).

Mais um sinal. O tango - ou seja, a cultura local e enraizada - continua ocupando o lugar que no brasa já está ocupado pelos enlatados internacionais. Isso mais as bandas locais de pop, muito mais respeitadas que as coisas de fora - que estão lá também, bueno, mas como complemento pro cenário todo. Comprei uma Rolling Stone local e folheando vc tem um panorama da cultura jovem argentina. Também comprei uma revista de música, literatura, cinema e arte chamada Los Inrockuptibles. Nome sugestivo: a cultura portenha, fortemente entrincheiradas nos cafés e livrarias da cidade, permance orgulhosa e enfática. E agora, más moderna e antenada. Muy bien. Na linha mais cabeça, achei a novíssima revista GataFlora, que está em sua segunda edição. O design argentino em geral também tem coisa nova pra mostrar. A revista 90+10, que dá um panorama muito legal do que está acontecendo em termos de diseño, creatividad e comunicación en Argentina.

Mas o punto fuerte dessa seção, pra mim, foi o MALBA. Com um museu assim, que coloca a arte latino-americana no plano internacional (o museu foi criado a partir da sensacional coleção de arte moderna latino-americana de Eduardo F. Constantini), acho que as coisas ficam mais fáceis pra todo mundo que mexe com arte, design e comunicação. Buenos Aires tem um tremendo ponto de referência pra quem está, na AL, procurando uma linguagem própria e legítima. Acho que é o ponto nevrálgico de tudo o que está acontecendo na capital argentina em termos de cultura contemporânea.

Propaganda

Uma coisa é o haute-couture da publicidade que aparece nos festivais, onde a Argentina vai muito bem, e outra coisa é o prét-a-porter dos breaks comerciais e das páginas das revistas. Mas o que se vê na TV argentina é melhor também. Ok, os breaks da Globo são bem mais comerciais e cheios de filmes de cerveja e automóvel, o que passa a impressão (real) de uma economia de consumo mais vibrante e colorida, mas também passa a impressão de que o público brasileiro é bem mais sensível ao monte de propaganda ruim que passa na TV. Os poucos filmes que eu vi na TV argentina têm uma incrível qualidade cinematográfica - resultado do forte cinema argentino, e não vale nem a pena tentar comparar com o brasileño, não sou especialista no assunto.

O filme da Ford , do novo Vento, é lindo, uma animação que não tem nenhum carro. Aí vc vê que o consumidor argentino não está com nenhuma disposição pra aguentar uma piadinha cretina pra comprar um bem que deve custar coisa de 50 mil Pesos. O filme é da JWT de lá.

O melhor que eu vi, entretanto, foi da banda larga Arnet. Em nome da liberdade (lá unica banda ancha sin abono) os caras propuseram, em um filminho hilário, que o dia 12 de Julho próximo seja "un dia sin ropa interior". Aí vc imagina. Tanto a agência precisa ter a idéia, quanto os bravos gerentes e diretores de mkt da marca precisam ter cojones pra entrar numa dessas. Mas isso me parece possível num mercado em renovação, em franca expansão e grande otimismo, com uma publicidade dominada por gente jovem, sem o ranço e sem o peso de uma premiada porém esgotada generación anterior.

Assim como no Brasil há dez anos, quando a publicidade brasileira era a novidade mundial.

Comments

alex said…
si muy bueno todo,pero y Menem?Carajo!
Andre Felipe said…
Menem es un clasico, pero no es más tendencia: es pura tradición.
Fê Resende said…
coloca mesmo os endereços e tals num outro post, tipo mini-guia. =)
Paula said…
Pelo visto deu pra curtir bem...
; )

bjs,
Paula
mz said…
quero muito conhecer. belo guia!
Selma Navarro said…
aê, hermano. pero duende esta su portunhol, que merroro mucho despues del fiap?
Adorei seu post. Dicas bacanas. Mas não é ser muito simplista comparar a Vila Madalena com Palermo V?
mauren.
Andre Felipe said…
Mauren,
na verdade a minha comparação é meio simplista mesmo, mas é pra dar uma idéia geral, do clima, da sensação que dá. Na verdade, eu comparei com a Vila Madalena misturada com a Galeria Ouro Fino e o Mercado Mundo Mix, e eu também não sei se essa é a melhor forma de exemplificar.
De toda forma, quem sabe vc não consegue uma definição melhor aqui pros nossos leitores? Sua participação é bem-vinda!

muito obrigado pelo comment, abraços
André
tati tsukamoto said…
ótima análise sobre buenos aires.
deu vontade de ir pra lá e conferir suas impressões e análises.

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